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0 A Festa da Insignificância + Opinião


  Aclamado em França e em Itália, este é o muito esperado novo romance do autor de A Insustentável Leveza do Ser, Milan Kundera, que regressa à ficção ao fim de treze anos.
  Lançar luz sobre os problemas mais sérios e, ao mesmo tempo, não proferir uma única frase séria, estar fascinado pela realidade do mundo contemporâneo e, ao mesmo tempo, evitar qualquer realismo, eis A Festa da Insignificância, onde o riso, inspirado na nossa época, é cómico porque perdeu todo o seu sentido de humor.
  Um surpreendente romance que coloca em cena quatro amigos parisienses que vivem numa deriva inócua, característica de uma existência contemporânea esvaziada de sentido e que que pode ser visto como um resumo de toda a obra de Kundera.

Editor: Dom Quixote (2014)
Género: Romance
Páginas: 160
Original: La fête de l'insignifiance (2013)



opinião
★ ★ ★ ★ __ (4/5)
«Compreendemos há muito que já não era possível derrubar este mundo, nem remodelá-lo, nem deter a sua infeliz corrida para a frente. Havia uma só resistência possível: não o levar a sério.» [p. 101]

Mais do que contar uma história, A Festa da Insignificância pretende passar uma mensagem... e o tom com que o faz - esforçando-se activamente para despojar de seriedade temas bastante sóbrios - acaba por tornar o conteúdo muito mais sugestivo e significante...quando o tema é precisamente a insignificância.

Kundera aborda o contemporâneo colocando em evidência o que é mesquinho, trivial, frívolo e ridículo; a insignificância do que somos,  do que fazemos, do que teorizamos e do que reverenciamos.

Concentrando um punhado de temas muito interessantes como o evidente declínio cultural de uma sociedade devotada à banalidade - cujo, por exemplo, grande objectivo de uma ida ao museu é tirar a proverbial selfie ao lado de uma qualquer obra de arte que os comparsas do Facebook reconheçam instantaneamente para lá irem colocar o seu like - bem como a maternidade e o seu papel condicionante na infância, os diferentes tipos de relacionamentos, a sexualidade e o significado da nossa existência.

...Mas este não é um livro de respostas, muito pelo contrário. Num enredo que segue aparentemente sem objectivo específico, Kundera diverte-se a levantar problemas, a enumerar questões e a atirar-nos à cara como somos as pacientes vítimas de uma colossal piadola de muito mau gosto...

Enquanto um grupo de quatro amigos troca ideias, preocupações e convicções, o autor recorre habilmente a uma boa dose de ironia e humor para despertar o nosso interesse e estimular a reflexão. Estaline e o comunismo vêm dar uma achega a um desvario cómico em que fica patente o desalento do autor perante a modernização e a tepidez dos conceitos actuais.

«O amor, outrora, era a festa do individual, do inimitável, a glória do que é único, do que não suporta qualquer repetição.» [p. 142]



Outras frases preferidas:

✏ «Há já vários anos que tinha começado a detestá-los, aos aniversários. Por causa dos números que se lhes colavam. No entanto, não chegava a desdenhá-los, porque a felicidade de ser festejado era para ele mais importante do que a vergonha de envelhecer.» [p. 15]

✏ «O silêncio chama a atenção. Pode impressionar.» [p. 25]

✏ «A inutilidade de ser brilhante (…)» [p. 26]

✏«As pessoas encontram-se na vida, conversam, discutem, zangam-se, sem se darem conta de que se dirigem uns aos outros de longe, cada qual num observatório erguido num lugar diferente do tempo.» [p. 36]

✏ «Infelizmente, nem a mais arrebatadora das graças escapa à lei do envelhecimento.» [p. 71]

✏ «O ser humano não é mais do que solidão» [p.84]

✏ «(…) a glória do muito grande poeta que, graças à humilde veneração pela poesia, havia jurado jamais escrever um único verso.» [p. 87]

✏ «Toda a gente palra sobre os direitos do homem. Que piada! A tua existência não é fundada sobre nenhum direito. Mesmo acabar com a tua vida pela tua própria vontade, eles não to permitem, esses cavaleiros dos direitos do homem.» [p. 135]

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