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Peito Grande, Ancas Largas
O presente romance, publicado na China em 1995, causou grande controvérsia. Algum conteúdo de teor sexual e o facto de não retratar uma versão da luta de classes consentânea com os cânones do Partido Comunista Chinês, obrigaram Mo Yan a escrever uma autocrítica ao seu próprio livro, e, mais tarde, a retirá-lo de circulação. Ainda assim, inúmeros exemplares continuam a circular clandestinamente.Num país onde os homens dominam, este é um romance épico sobre as mulheres. Sugerido no próprio título, o corpo feminino serve como imagem e metáfora ao livro. A protagonista nasce em 1900 e casa-se com 17 anos. Mãe de 9 filhos, apenas o mais novo, é rapaz. Jintong é inseguro e fraco, contrastando com as 8 irmãs, fortes e corajosas. Cada um dos 6 capítulos representa um período, desde o fim da dinastia Qing, passando pela invasão japonesa, à guerra civil, à revolução cultural e aos anos pós Mao.Um romance que percorre e retrata a China do último século através da vida de uma família em que os seres verdadeiramente fortes e corajosos são as mulheres.


«Se quiserem, podem ignorar todos os meus outros livros, mas é obrigatório que leiam Peito Grande, Ancas Largas. É um romance sobre a história, a guerra, a fome, a política, a religião, o amor e o sexo!» Mo Yan.


Autor: Mo Yan
Editor: Ulisseia (2007)
Género: Romance
Páginas: 690


Opinião


Num estilo único e muito próprio, Mo Yan, vencedor do Prémio Nobel da Literatura de 2012, traz-nos uma magnífica epopeia que narra, de forma ímpar, a atribulada História da China através da história de vida de uma família, os Shangguan; atravessando a linha do tempo desde a queda da dinastia Qing, passando pela Segunda Guerra Sino-Japonesa, a guerra civil, a Revolução Cultural e consequente fome de 1958/1961. Claro que se adicionarmos a tudo isto o facto de que há ainda locais neste mundo em que expressar a opinião pessoal é um acto de coragem, temos um livro verdadeiramente prodigioso.

Assumindo implicitamente uma posição, Mo Yan encheu as páginas deste livro de episódios sangrentos e descrições de horrorosas calamidades, mascaradas com descrições chocantes e exageradamente apatetadas reflectindo as políticas sombrias e voláteis praticadas na época.

Começamos com Shangguan Lu que espera ansiosamente ser abençoada com o nascimento de um filho do sexo masculino, o que acontece apenas ao 8º parto, no qual nascem uma menina e finalmente (!) o tão desejado menino - Jintong. Ironicamente, dos seus 9 filhos, o almejado Jintong é o menos prolífico, o menos capaz de fazer seja o que for, um fardo para toda a família, o único que falha em perpetuá-la, tal como falha em tudo o resto. Não fosse esta descrição triste o suficiente, Jintong é também obcecado por seios e pelo leite por eles gerado. O pouco sucesso que consegue conquistar na vida deve-se apenas a sorte fortuita ou à sua associação à família, sendo este também cruelmente temporário já que Jintong não o consegue sustentar por muito tempo.

E se as personagens vão sendo devoradas, uma a uma, por mortes insignificantes e sem qualquer sentido, em contrapartida, apresentam-se-nos bem vivas nas fabulosas descrições do autor. As mulheres assumem um papel de destaque nesta obra e a essência feminina permeia não só o título mas todo o livro, com especial destaque para a Mãe: uma figura forte, perseverante e batalhadora. O que, num mundo dominado por homens, se torna ainda mais formidável.

Com a evolução da história de Jintong, evolui a História do país, manchada por tempos de fome, pobreza e violência. A vivificar a extensão destas adversidades, a escrita de Mo Yan apresenta-se crua, chocante, cruelmente honesta e intencionalmente obscena - enfim, pura. As tiradas do autor são certeiras e conclusivas, prenhes de um simbolismo extremamente inteligente e engenhoso.

O humor negro e o sarcasmo satirizante a que o autor recorre constantemente, vão exactamente de encontro ao meu gosto pessoal. O domínio que o autor exerce sobre a actividade individual de cada personagem, especialmente nos primeiros capítulos, assombrou-me - o tempo flui e continua a espiralar à volta das personagens à medida que o narrador se dedica ora a uma, ora a outra, todas elas continuando com as suas acções simultâneas.

Por tudo isto… e tudo o resto… adorei o livro!

Frases Preferidas...
«A Mãe olhou para as nuvens dispersas, no alto, e murmurou:
- Abre os olhos, Senhor, e vê por um momento o nosso mundo…»
«Nada há mais venenoso que a picada de um vespão, nem nada mais duro e seco que um doutor sem compaixão.» 
«Até no inferno o dinheiro faz do diabo um moleiro.» 
«O tiro que matou Ma Tong ensinou-nos que, em tempo de guerra, a vida humana não valia mais do que a das formigas.» 
«A Mãe olhou para as nuvens dispersas, no alto, e murmurou: 
- Abre os olhos, Senhor, e vê por um momento o nosso mundo…» 
«Morrer é fácil, o difícil é viver. E quanto mais difícil, maior a vontade de viver. E quanto maior o medo da morte, mais a gente luta para continuar viva.» 
«Vida e morte são distintas; se uma queres, a outra fintas.»

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